Em busca de sanar com a tuberculose, doença que mata inúmeras pessoas por toda a América do Sul está sendo colocada em prática novas técnicas. As mesmas partem desde comprimidos com sensores para o controle da ingestão até outros diagnósticos diferenciados
O Brasil mantém a doença sob vigília, entretanto outros países vizinhos sofrem com as baixas. Para eles a tuberculose é uma epidemia.
A batalha contra a tuberculose, a doença infecciosa mais letal do planeta, segue em ritmo exasperante. Com as atuais quedas de cerca de 1% ao ano, demoraríamos um século e meio para eliminar a epidemia. Enquanto isso, a doença continua matando anualmente quase dois milhões de pessoas. Os motivos para que uma doença antiga, prevenível e curável continue causando tanto dano à humanidade são tantos quantos as soluções, que passam, segundo insistem os pesquisadores, por criar “novas ferramentas”.
Uma série delas foi apresentada semana passada na 48aConferência da União Internacional contra a Tuberculose e Doenças Respiratórias (The Union) em Guadalajara (México). Não existe uma varinha mágica que possa solucionar tudo da noite para o dia; a ansiada nova vacina que revolucionaria a luta contra o bacilo não é esperada em curto prazo; mas realmente existem contribuições, umas mais consolidadas do que outras, que juntas podem permitir continuar avançando para que a epidemia seja história em 2030, assim como propôs a comunidade internacional nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Estes são alguns dos avanços mais promissores apresentados em Guadalajara:
- Terapia de observação sem fio
O tratamento para a tuberculose existe; assim como a cura. O problema é que é longo: dura seis meses e os pacientes começam a se sentir bem logo nas primeiras semanas, então é frequente que abandonem a medicação antes de estarem totalmente recuperados. As consequências podem ser muito graves, já que a bactéria é capaz de gerar resistências aos antibióticos e, nesse caso, já não é tão simples acabar com ela. Para evitar isso, sempre que é possível, a ingestão de comprimidos é supervisionada por profissionais de saúde ou voluntários que garantem que o paciente está seguindo adequadamente o tratamento. Mas essa estratégia carece de recursos óbvios: falta de pessoal, capacidade de acompanhamento de um número limitado de doentes, impossibilidade de fazê-lo durante todos os dias da semana…
Com as atuais quedas de cerca de 1% ao ano, demoraríamos um século e meio para eliminar a epidemia. Enquanto isso, continua matando anualmente quase dois milhões de pessoas
A terapia de observação sem fio pode ser uma solução para isso. Consiste em que os comprimidos incorporem um sensor comestível que interage com um equipamento que o paciente usa grudado à pele. Quando toma o remédio, é detectado e a informação é enviada por tecnologia bluetooth a um dispositivo móvel que está conectado a um servidor seguro de Internet, no qual profissionais de saúde podem confirmar a ingestão de forma remota. Uma pesquisa controlada com o dispositivo WOT (em sua sigla em inglês), aprovado pela agência que controla os medicamentos nos Estados Unidos (FDA), comprovou que o método é 54% mais eficiente do que a observação direta, segundo informou Sara Browne, da Universidade da Califórnia.
Na opinião de Paula Fujiwara, diretora científica da The Union, trata-se de um dos avanços mais promissores apresentados este ano no congresso. “Falta ver até que ponto é aplicável”, pondera. O custo e as dificuldades de acesso à tecnologia podem ser um obstáculo a seu avanço. “Estamos trabalhando para levantar todos esses detalhes”, afirmou Browne.
- Novos métodos diagnósticos
O diagnóstico da tuberculose é lento e exige pessoal especializado, algo nem sempre fácil de conseguir nos locais em que a doença está mais presente: lugares pobres superpovoados e com falta de condições higiênico-sanitárias. A forma mais comum de detectá-la é com o cultivo do esporo, algo especialmente difícil de conseguir em crianças. Duas técnicas apresentadas em Guadalajara tentam mudar essa realidade: uma coleta amostras de células raspadas da boca e outra se baseia em avanços na análise do sangue, uma técnica utilizada, mas não recomendada pela OMS até hoje por não ser tão confiável.
- Vacinação precoce
Não existe vacina para a tuberculose comum, mas uma efetiva que é feita há um século para meningite tuberculosa e tuberculose miliar, agressivas demais em crianças. Rebecca Harris, da Escola de Saúde e Medicina Tropical de Londres, está estudando, a partir de modelos matemáticos, o impacto dessa imunização ao nascer, com seis semanas, aos seis meses e com um ano de vida, na mortalidade infantil global em diferentes cenários. Os primeiros resultados sugerem que se deve manter a recomendação atual de vacinar recém-nascidos, e tomar medidas para melhorar a disseminação para reduzir os atrasos (e assim os recém-nascidos receberem realmente proteção), o que poderia evitar entre 5.000 e 30.000 mortes por ano.
- Melhorar as estratégias…
Para além das novidades científicas, levando-se em conta que a tuberculose tem diagnóstico e tratamento efetivo na grande maioria dos casos (exceto em alguns nos quais a bactéria adquire resistência aos fármacos), é crucial usar esses recursos de forma adequada. Um número especial da revista Health Planning and Policy revisou o estado da doença no Sudeste Asiático. O editor convidado dessa série de artigos, Mishal Khan, da Escola de Saúde e Medicina Tropical de Londres, no Reino Unido, assegurou que a evidência demonstra cada vez mais que a resolução de problemas se deve definir localmente, levando em conta as características de cada comunidade.
- …. e o financiamento
E falta dinheiro para levar diagnóstico e tratamento para quem precisa. Como destaca Paula Fujiwara (The Union), não será possível melhorar esses números de queda da tuberculose em torno de 1,5% anual para 10% ou 15% se não for seguido o Plano Global contra a Tuberculose, que estima necessários 65.000 milhões de dólares daqui a 2020 para prevenir 45 milhões de novas infecções, implementar 29 milhões de tratamentos e salvar 10 milhões de vidas. A cifra de 65 bilhões parece muito dinheiro, mas não investi-los, segundo o documento, custará oito vezes mais.
Fonte: El País